quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Israel x Palestina: entenda como começou a briga

Conflito existe há mais de 60 anos e já matou milhares de pessoas

Nos últimos dias, o mundo acompanhou uma onda de ataques por parte do Estado de Israel contra o povo palestino na região centro-leste do Oriente Médio. A investida que começou no fim de dezembro de 2008 já superou a marca de 1.200 mortos, em sua ampla maioria de origem palestina, e mais de 5.000 feridos. Os números e a desproporcionalidade entre as vítimas impressionam, principalmente pelo fato de Israel ser um Estado de origem judaica que já sentiu na pele a perseguição anti-semita que culminou no genocídio de seu povo.

Mas o conflito entre israelenses e palestinos não é algo novo, que possa simplesmente ser explicado pela atuação religiosa do grupo político Hamas. A trama envolve mais do que lançamentos de mísseis e extremismo religioso. Trata-se de uma história complexa e violenta que atinge um território que é menor do que Alagoas, mas que já rendeu milhares de mortos e a impopularidade de uma país (Israel) que vem sendo questionado por toda comunidade internacional pelo possível genocídio que está cometendo em pleno século XXI.


Origem do Estado de Israel

No final do século XIX e começo do século XX, quando o povo palestino habitava a região onde hoje existem Israel, Cisjordânia e Faixa de Gaza, observou-se o início de um fluxo de judeus para as terras árabes conhecidas como Palestina. A chegada de pessoas de origem judaica ao território palestino não causou problemas e foi feita sem qualquer guerra, estabelecendo os judeus pequenas colônias (kibbutz) e vivendo pacificamente com os árabes. Esse deslocamento de pessoas de origem judaica se dava pela crescente onda de antissemitismo, movimento caracterizado pelo princípio de “ódio aos judeus” (judenhass), que assolava o mundo.

A ascensão do nazismo, encabeçado por Adolf Hitler, levou o preconceito contra os judeus a um nível alarmante, que acabou no extermínio de mais de 6 milhões de pessoas. Começou-se então a discussão sobre a possibilidade de criação de um país para a população judaica, pensou-se na Argentina, no Chipre, em Uganda e até no Sinai. Mas nesse momento o Sionismo ganhava força de atuação na questão. Esse movimento é caracterizado pelo princípio de criação de um Estado judeu.

Raphael Eitan, chefe do Estado Maior das Forças Armadas Israelenses e um dos seguidores do sionismo, em 1947, revelou um pouco da essência do movimento que pretendia formar o Estado Judeu:

“Declaramos abertamente que os árabes não tem qualquer direito a um só centímetro de Eretz Isral. Os de bom coração, os moderados, devem saber que as câmaras de gás de Adolf Hitler serão como brincadeira de criança. O único que entendem e entenderão é a força. Utilizaremos a força mais decisiva, até que os palestinos se aproximem de nós de joelhos”.

Um dos teóricos da corrente sionista, o húngaro Theodor Herzl, que escreveu o livro O Estado Judeu, revelou em sua obra que a escolha da Palestina estava relacionada com a existência de Jerusalém. Segundo ele, apenas o argumento da terra sagrada seria capaz de mobilizar a massa judaica a invadir e lutar por um território. Países ocidentais como EUA e Grã-Bretanha automaticamente apoiaram a decisão, pois viam na região escolhida um local estratégico para seus interesses. Era uma área em que os países imperialistas não possuíam aliados, e ainda existia o Canal de Suez que é um ótimo corredor de transporte.


Processo de Invasão

Em 1946, pouco antes da criação do país israelita, existiam na região aproximadamente 1.500.000 palestinos e 500.000 judeus. Apesar de o número de árabes ser o triplo da população judaica, em 1948, a Organização das Nações Unidas (ONU) reconhece o Estado de Israel e dá aos judeus 57% das terras. Para o professor e historiador Gustavo Pessoa, essa desproporcionalidade foi possível devido ao alto grau de comoção proporcionado pelo holocausto. “O genocídio judaico veio a ser conveniente para o movimento sionista criar o Estado judeu. Para se ter uma idéia, foram 6 milhões de judeus mortos e eles se vitimizaram muito mais do que os 20 milhões de soviéticos que morreram” - lembrou ele.

Esse processo de partilha das terras foi considerado injusto pelos palestinos, que contestavam as terras que outrora pertenceram a eles. Após esse primeiro momento, outras guerras aconteceram como a de Independência, a de Suez, a dos Seis Dias e a do Yomkippur (dia do perdão). Isso fez com que os israelenses tomassem posse de quase 100% do território anteriormente delimitado pela ONU. Além disso, o Estado de Israel também invadiu outros países como Síria (Colinas de Golã) e Egito (Península do Sinai). Esses avanços militares causam a migração de mais de 2 milhões de palestinos para países vizinhos.

Aos que permaneceram no território, restou serem encurralados ou na Cisjordânia ou na Faixa de Gaza, com uma densidade demográfica de 4.000 pessoas por km². Após décadas de conflitos e a percepção de que as vias diplomáticas não resolveriam o problema, começou-se um levante popular que seria conhecido como Intifada. Em 1988, o povo dominado rechaça a invasão sofrida e pessoas vão às ruas enfrentar os soldados israelenses com paus e pedras nas mãos.

Israel, a última democracia do Oriente Médio?

Uma das grandes defesas que o governo dos EUA faz à criação de Israel no Oriente Médio é de que seria o último país democrático da região. Mas esse caráter de democracia não faz sentido quando se lembra que a essência do novo país é a de um Estado judeu, e que garante, constitucionalmente, o acesso àqueles que reivindicarem o judaísmo. Algumas leis criadas pelos israelenses também vão contra essa imagem que procura passar o governo norte-americano.

A Lei da Nacionalidade é um exemplo disso, onde, segundo ela, qualquer cidadão que se casar com alguém de origem do povo ocupado, perde seus direitos junto ao Estado. A Lei do Retorno, por sua vez, diz que qualquer judeu do mundo pode migrar para Israel e obterá inúmeros privilégios, aos quais os palestinos não têm acesso devido ao fato de não serem judeus. Há ainda a Lei do Ausente que determina a expropriação das terras palestinas que não tenham sido trabalhadas durante algum tempo, quando o mesmo não vale para as propriedades de posse judaica.

Mas nenhuma delas supera a chamada “Lei das Terras”, na qual 90% das propriedades privadas devem pertencer apenas a judeus, não podendo o povo palestino adquirir quaisquer terras, ainda que já tenham sido suas, caso a negociação infrinja essa porcentagem.



Hamas e o processo de paz

Quanto a violência do lado palestino, comumente se atribui os ataques ao grupo extremista religioso Hamas. Esse grupo, criado no final de 1987, pode ser entendido como um movimento islâmico de resistência que busca recuperar as terras palestinas e criar uma república baseada no islamismo, trilhando o mesmo caminho dos sionistas. Poucos sabem, mas os próprios membros do Hamas chegaram a ser financiados pelos EUA, na tentativa de enfraquecer outro grupo palestino, o Fatah.

O jogo político norte-americano acabou dando errado, pois o Hamas utilizou o financiamento que vinha da América do Norte, mantendo o princípio de destruição do Estado de Israel, e ainda adquiriu alta popularidade junto à população palestina. Primeiro pelo trabalho de base que realiza junto aos palestinos, em serviços de educação, saúde, assistência, dentre outros. E segundo, devido ao fato de o grupo islâmico se manter fiel à reivindicação das terras.

A Organização pela Libertação Palestina (OLP), que se transformou em Autoridade Nacional Palestina após reinterpretar sua relação com Israel, aceitou a invasão e o novo Estado. Isso causou certa insatisfação na população, que vivia em condições miseráveis, e pretendia lutar para recuperar suas antigas terras. Sobrou então apenas o Hamas como grupo político que, não por coincidência, ganhou as eleições para gerenciar a Faixa de Gaza. Mas, obviamente, que a ideologia difundida pelo grupo Hamas não poderia ser a solução para a região, seria como trocar a criação de um Estado judeu por um Estado islâmico.

A possibilidade de um processo de paz na região não parece chegar ao horizonte dessa geração. No último sábado (17), foi iniciado outro cessar-fogo, mas logo depois houve novo confronto, e uma centena de palestinos morreu em bombardeio israelense. Para Gustavo Pessoa, a única saída para o conflito seria retornar toda área à Palestina. “Imagino na verdade que esse fim está muito distante, e isso só aconteceria se os dois lados estivessem dispostos a aceitar uma Palestina laica. Uma solução como essa só poderia ser possível com a destruição do projeto sionista, que em larga medida significaria o fim do Estado de Israel” - enfatizou ele.

Assim, quando se fala em um acordo de paz, é preciso entender que cada parte irá impor suas condições. O Hamas propôs um cessar-fogo de um ano em troca da retirada das tropas israelenses da Faixa de Gaza e o fim do bloqueio de fronteira imposto por Israel. O Estado judeu por sua vez, exigia o desarmamento do Hamas e a continuidade de fiscalização das fronteiras de Gaza.

Atualidade

Diante desse histórico, é possível entender o sentido do que está acontecendo no Oriente Médio, e a dificuldade em se conseguir um acordo de paz. O historiador Gustavo Pessoa acredita que a ofensiva israelense é, na verdade, uma resposta a opinião pública. “Israel precisava dar essa resposta, sobretudo ao vizinhos muçulmanos após a derrota para o Hezbollah em 2006. A resposta tem a finalidade de reafirmar a superioridade militar e garantir uma correlação de força favorável a manutenção do atual governo israelense em um ano eleitoral” - revelou.

Mas o resultado final dessa tentativa de imposição acabou trazendo um saldo extremamente negativo para os israelenses. Israel recebeu uma reprovação geral da comunidade internacional, que condenou o que agora se assimila a uma série de medidas que está tomando o caráter de um genocídio. Surgiram protestos por todo o mundo, e até mesmo dentro da capital Jerusalém aparecem manifestações pró-palestinos.

A ONU, por sua vez, já revelou a possibilidade de abrir investigações contra Israel sobre possíveis crimes de guerra. Apesar disso, não há esperanças de que a entidade internacional avance na questão. Basta lembrar quem em 2003, os EUA invadiram o território iraquiano sem autorização das Nações Unidas. O caso é semelhante, mas os norte-americanos, desta vez, agem, indiretamente, enviando bilhões de dólares para aumentar o poderio bélico dos israelenses.

Fonte: Gazetaweb com colaboração de Victor Guerra

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